lundi 24 avril 2017

Evasão

Ao sair das trevas da noite que a manhã
Submerge numa onda de esperança,
           despertas do torpor, enjoada de cheiros
           confluentes da vida desencantada,           
que conheces bem, ao lento e sensual
desfraldar do perfume fresco da tua carne.

Acaricias o gato estendido no teu regaço,
fulvo como pelúcia macia
animada de ansiosos  latejos.
O aroma do café que saboreias de olhos
meios fechados, num debruçar de seios
em liberdade, arrebata a tua alma,
leva-te para um campo de cafeeiros,
num  voluptuoso sonho acordado.

Corres no meio deles nua, de boca
entreaberta, os braços estendidos,
os poros dilatados,
colhendo as indeléveis sensações do país
tropical que te afeiçoou o corpo moreno
e te pôs no sangue o fogo do amor.

Mas o relógio depressa te traz de volta
para a solidão de Lisboa,
onde tens que enfrentar a outra face
da vida, feroz como loba esfomeada.
Tens uma nesga de céu azul por cima
do centro comercial, cuja fachada
sem poesia, entre sombra e luz, te deixa
adivinhar o cariz do dia, mais fatigante
que a longa travessia dos mares.

J. L. Miranda



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